segunda-feira, 11 de julho de 2011

Um porre de embriaguez ao volante: a quarta dose


Muito mal, mal mesmo, quase sem conseguir digitar. Mas, vamos! Não é só a jurisprudência que reserva “novidades” no que se refere ao delito do art. 306 da Lei de Trânsito. Cássio Honorato, membro do Ministério Público do Estado do Paraná, em curso de pós-graduação de Direito de Trânsito em cidade catarinense expôs uma nova tese.

Considerando às milhares de mortes em razão de eventos de trânsito propôs a flexibilização do direito do condutor de veículo automotor não produzir provas contra a sua pessoa e frisou que as argumentações doutrinárias de primeira hora de que a incidência da punição penal estaria afastada diante da negativa do agente em se submeter ao exame pericial devem ser desconsideradas.

Neste contexto sugeriu uma dupla tipicidade na redação do art. 306 do Código de Trânsito (no mesmo sentido, mas sem uma excessiva abrangência: Renato Marcão, 2009), ou seja, a presença de dois crimes na nova redação do tipo penal e a comprovação de cada qual se realizaria de maneira distinta. Um pouco mais detalhadamente.

Seguindo sua orientação ficará comprovada a materialidade da primeira parte do tipo (até o termo decigramas) por meio do exame de sangue para aferir o grau de concentração mínima de seis decigramas de álcool no tecido sangüíneo ou por meio do bafômetro para constatar a concentração mínima de três décimos de miligramas de álcool por litro de ar expelido dos pulmões. O Promotor resolveu inovar destacando que a segunda parte do dispositivo deve ser interpretada de maneira extensiva, para incluir na expressão ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine a dependência, o próprio álcool. Assim, entende que caso o condutor do veículo se negue à realização do exame pericial, o crime poderá ser caracterizado pela adequação da conduta à segunda parte da redação, porque o agente estava sob a influência de álcool que, por sua vez, também é substância psicoativa que causa dependência e, assim, qualquer prova em direito admitida poderá ser utilizada para comprovação, pois para essa segunda parte não é necessária uma dosagem mínima.

Como destaquei em meu livro (Direito Penal de Trânsito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010), não há palavras avulsas na lei. Quando o legislador utilizou na segunda parte do preceito penal o termo outros por evidente não quis abranger o álcool, porém justamente o contrário, isto é, enaltecer drogas diversas (como, por exemplo, os psicoativos). Além disso, nosso ordenamento jurídico é um conjunto de normas harmônicas e o que o Promotor sustenta é uma desarmonia normativa, pois como tratar a mesma situação de forma diversa? De nada adianta uma inovação se para colheita de provas a acusação transgride garantia constitucional. O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por sua vez, corretamente já descartou essa inovação. Destaco textualmente:

“[...] por outro aspecto, não se pode proceder à interpretação extensiva da norma – ‘ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência’ – que ilustra o art. 306 do CTB. Isso porque, além de analogia in malam partem, nosso legislador foi específico em relação ao álcool, determinando a quantidade necessária para caracterização do delito” (TJPR, 2ª C. Crim, Recurso criminal n. 635506-8, de Foz do Iguaçu, rel. Des. Miguel Kfouri Neto, j. 22/04/2010).

Devo enfatizar que há argumentos doutrinários de primeira hora muito melhores do que teses ministeriais. Ninguém ganha no grito!

Nenhum comentário:

Postar um comentário