quarta-feira, 3 de julho de 2013

Apropriação indébita

Casos de ações na justiça para recebimento de Seguro DPVAT são comuns, no entanto, três processos em particular julgados pelo juiz titular da 14ª Vara Cível de Campo Grande, Fábio Possik Salamene, chamam a atenção. Os casos se referem a dois advogados condenados por não repassarem o dinheiro do seguro aos seus clientes. 

Duas ações se referem ao mesmo acidente, os advogados foram condenados ao total de R$ 26 mil por danos morais e a restituição total de R$ 38 mil pelo seguro. Na outra, apenas um deles figura como réu e foi condenado ao pagamento de R$ 20 mil por danos morais e a restituição de R$ 21.700,00 do seguro DPVAT. 

A última das três sentenças data de 12 de junho de 2013. Em outro caso, foi ajuizado um recurso na última terça-feira (25). No outro processo, após recurso que manteve a decisão de 1º grau, a sentença transitou em julgado no mês de março de 2013. 

O último processo, no qual houve a interposição de recurso, foi ajuizado em fevereiro de 2012 por O.M.D. contra os advogados J.C.T.N. e E.L.N., sob o argumento de que no dia 14 de maio de 2007 sofreu acidente de trânsito que o deixou com sequelas. Diante disso, o autor contratou os réus para advogar em seu favor para receber o seguro obrigatório DPVAT. Ao fim do processo, ele obteve êxito. 

No entanto, narra o autor que os réus, sem sua ciência, no dia 7 de dezembro de 2011, retiraram a íntegra do valor da indenização depositado (R$ 31.900,00). Sustenta o autor que os advogados ocultaram tal fato e afirmavam que o pagamento não era feito em razão da morosidade da justiça. Argumentou nos autos que, descontadas as custas e honorários advocatícios, os réus devem a ele a quantia de R$ 20.097,00. 

Citado, o réu E.L.N. sustentou que era parte ilegítima para figurar no processo, pois era apenas advogado substabelecido, afirmando que os valores foram levantados pelo outro réu. Não havendo assim prova de culpa da sua parte. 

Também citado, J.C.T.N. apresentou contestação afirmando que ficou surpreso com a ação, pois as advogadas do autor eram suas parceiras e há compensações a serem feitas a ele, narrando uma situação sem nenhuma relação com o presente caso. 

Conforme analisou o juiz, “o mandato outorgado pelo autor aos réus revela que a relação entre as partes era, por óbvio, contratual”. Desse modo, continuou o magistrado, “cabia aos réus demonstrar que não retiveram indevidamente os valores mencionados alhures, acostando o competente recibo de repasse do indigitado valor ao autor, para se eximirem da responsabilidade”. O que não fizeram. 

Desse modo, entendeu o juiz que houve a retenção indevida de valores. Quanto à responsabilidade dos réus, o magistrado também afirmou que é solidária, isto porque, embora o autor tenha contratado primeiramente J.C.T.N., “este substabeleceu seus poderes ao réu E.L.N., como este admitiu, sendo certo que ele próprio subscreveu a transação com a indigitada seguradora, posteriormente homologada, tendo o primeiro levantado os valores depositados”. Restando assim configurada a responsabilidade de ambos, frisou o juiz. 

Para o magistrado, “a conduta atribuída aos réus configura, em tese, crime de apropriação indébita, senão o de patrocínio infiel”. Quanto aos danos morais, “a indevida e dolosa retenção praticada pelos réus, da importância que deveria ser repassada ao autor, exorbitou daquilo que se pode reputar como mero dissabor”. 

Em outro processo análogo, ajuizado por A.L.R., também se refere ao acidente de 14 de fevereiro de 2007 e que ganhou a quantia de R$ 28.800,00 de seguro DPVAT. Sustentou que o valor também foi retido pelos mesmos advogados e que, com os descontos legais, fazia jus ao recebimento de R$ 18.144,00. Os réus mantiveram os mesmos argumentos e foram condenados. 

O advogado J.C.T.N. aparece como réu em outro processo ajuizado por J.J. dos S. que, em 27 de julho de 2005, outorgou procuração ao réu para que ele o representasse em ação de cobrança de seguro DPVAT. A ação foi julgada procedente em 30 de agosto de 2006 e o trânsito em julgado ocorreu em 12 de novembro de 2007. 

Afirmou o autor que celebrou acordo com a seguradora, tendo recebido R$ 21.700,00, dinheiro que permanece em poder do advogado. Sustentou o autor que, com os devidos abatimentos, ele faz jus ao recebimento de R$ 15.624,00. Pediu a condenação do réu ao pagamento de perdas e danos morais. Citado, o advogado sustentou desta vez que ele pagou a suposta esposa do autor, como também demais parentes autorizados pelo autor. 

Conforme o juiz, “mesmo facultada a produção de provas, o réu não demonstrou a existência de quaisquer fatos impeditivos, extintivos ou modificadores do direito do autor, não juntando, sequer, um documento nesse sentido”. 

O magistrado também julgou procedente o pedido de danos morais, pois o advogado privou o autor do uso da verba de indenização acidentária por cinco anos, e ainda porque, “além de todos os percalços por que passou em virtude do acidente ocorrido, é pessoa humilde e confiou no réu para que bem patrocinasse sua causa, contando com o dinheiro da indenização a que fazia jus e que este não lhe repassou, frustrando-lhe, sobremaneira, a expectativa havida”. 

Por esta razão, o juiz entendeu que o critério mais justo foi fixar em R$ 20.340,00 de danos morais, como também o valor total do seguro, ou seja, R$ 21.700,00. 

Consultado a respeito dos fatos, o juiz disse: “Sem me ater aos casos especificamente mencionados, entendo que o cidadão deve estar atento ao escolher seu advogado, pois a outorga de mandato pressupõe confiança na conduta ética desse profissional. Noutro vértice, cabe ao Poder Judiciário responder, diante dessas situações, com energia e brevidade, quando provocado. Da OAB e do Ministério Público é razoável que se espere a apuração dos fatos e a aplicação das sanções administrativas e criminais eventualmente cabíveis. O bom funcionamento da Justiça não pode ser alcançado se todas as suas peças não estiverem agindo bem”. 

Fonte: Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul

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