terça-feira, 20 de maio de 2014

Direito Penal para quem?

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, determinou o trancamento de ação penal contra uma mulher presa em flagrante em março de 2011 e condenada a quatro meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, por tentativa de furto de um pacote de fraldas de um estabelecimento comercial em São Paulo. A decisão foi tomada na sessão desta terça-feira (6) no julgamento do Habeas Corpus (HC) 119672, de relatoria do ministro Luiz Fux. 

O HC foi impetrado pela Defensoria do Estado de São Paulo em favor de F. B. M. contra decisão de ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Perante o Supremo, a defesa pedia a concessão da liminar ao sustentar que o regime inicial para cumprimento da pena deveria ser o aberto, ressaltando a desproporcionalidade da fixação do regime semiaberto, considerados o crime praticado e a pena imposta. Segundo alegou, F.B.M. já cumpriu mais de 1/6 da pena, uma vez que permaneceu presa preventivamente por dois meses e dez dias, e teria direito ao cumprimento do restante da pena em regime aberto.

O ministro Luiz Fux deferiu a liminar em outubro de 2013. 

Voto 

“Esse caso comprova que atualmente, também no Direito Penal, se tem de avaliar os fatos sob o ângulo da proporcionalidade e da efetividade da justiça criminal”, salientou o ministro Luiz Fux. Ele lembrou que Heleno Fragoso, professor titular de Direito Penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em aula inaugural daquela universidade, “protagonizou que não queria um direito penal melhor, queria algo melhor do que o direito penal”. “Já naquela oportunidade tinha essa percepção de que alguns fatos deveriam escapar da apreciação do processo penal e ser analisados até em uma esfera de assistência social”, acrescentou o ministro. Ele desenvolveu em seu voto não apenas a questão do princípio da bagatela, mas também a influência do princípio da proporcionalidade. 

“Há casos da vida social em que o estado de necessidade é presumido e, no meu modo de ver, é justamente o que ocorre no caso”, destacou. “Uma mãe que furta um pacote de fraldas de um estabelecimento comercial - e na verdade foi uma tentativa de furto, porque ela foi surpreendida - precisava ser ouvida em outra seara que não fosse a penal”, observou o relator. Para ele, F.B.M. deveria ter um tratamento igual ao que se confere àquele que comete furto famélico. 

Em razão da formalidade processual, o ministro Luiz Fux julgou extinto o HC, por inadequação da via eleita, mas concedeu a ordem de ofício para trancar a ação penal. Seu voto foi seguido pela Turma por unanimidade. Conforme o ministro Roberto Barroso, o Direito Penal no Brasil “está desarrumado” tanto do ponto de vista normativo quanto do filosófico, “e este caso é uma prova cabal disso”. Ele destacou que o sistema penal brasileiro entendeu que deveria ser decretada a pena de prisão, em regime semiaberto, contra F.B.M., “portanto efetivamente, ela está dentro do sistema pela tentativa de furto de um pacote de fraldas descartáveis”. “É preciso pensar o quantum de direito penal, para quem é o direito penal. Certamente essa não é uma forma de lidar com problemas sociais como os que estão envolvidos neste caso”, ressaltou. 

Processos relacionados: HC 119672 

Fonte: Supremo Tribunal Federal

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